quinta-feira, 13 de março de 2014

A dor do outro



               Desde que não houve mais espaço para o homem no paraíso, em razão do pecado, a história do povo de Deus é permeada de dor e sofrimento. Por causa do egoísmo, da inveja e da ambição desmedida, a desigualdade social cresce cada vez mais e provoca situações desagradáveis e conflitantes.
            Foram muitas as situações de conflitos pelas quais passaram nossos ancestrais: a morte de Abel, bem no início da história; a tirania dos reis e dos faraós; a escravidão no Egito; o sofrimento de José, vendido por seus próprios irmãos; a morte de tantos mártires e inocentes em toda a história da humanidade.
            Deus mandou seu filho à Terra para redimir a humanidade. Mas também ele foi humilhado, blasfemado e crucificado. Poucos se importaram com as barbaridades que sofreu, ou se compadeceram com suas dores.
            Ainda hoje, o povo sofre as consequências da crueldade e ambição do grupo dominante, que causam tanta dor, opressão, preconceito.
            Até mesmo entre pessoas que convivem mais de perto, em uma cidade pequena, por exemplo, não há a devida preocupação uns com os outros. A modernidade e a era tecnológica estimulam uma vida isolada e a busca pelo prazer acima de tudo. Cada um luta por maior conforto, mais espaço, mais comodidade e se esquece de que há muitos que sofrem, passam necessidades, vivem sós. Quando estão bem ou festejam, tornam-se - às vezes até inconscientemente - egoístas. A dor do outro fica esquecida.
            São muitas as situações de sentimentos contrastantes com as quais nos deparamos no dia a dia. Há festas com música altíssima em bares, casas de shows ou mesmo residências, enquanto alguém não consegue dormir, outro agoniza, um sofre com uma doença qualquer. A festa continua. Ninguém toma consciência da dor do outro.  Vamos a um velório e encontramos um pequeno grupo rezando ou consolando os familiares. A maioria está ali cumprindo o seu papel social. Por vezes, apenas uma pessoa sofre ao lado do parente amado do qual se despede. A dor é sua. Mesmo que a sala esteja cheia, ninguém sente - ou compreende - tamanho sofrimento.
            Até mesmo na Igreja, durante a Celebração Litúrgica, percebemos essa separação. Uma família está ali para celebrar, em ação de graças, os quinze anos da filha; outra, os noventa anos da avó; outra, ainda, celebrando as bodas dos pais. Enquanto isso, uma família que se encontra despedaçada, sentindo uma dor muito grande, foi rezar pelo sétimo dia de falecimento de um parente querido. As famílias não se misturam. Cada uma em seu canto. Uns fazem pose para fotos, outros se encolhem por não aguentar tamanha dor nos ombros. E choram. Depois da celebração, quem se compadece do sofrimento alheio? Poucos. Alguma alma generosa que percebe a necessidade de se aproximar e dirigir ao irmão uma palavra de conforto e de fé.
            No curso natural da vida a cena se repete. Enquanto uma família está felicíssima pelo nascimento do filho tão esperado, outra - às vezes bem perto - chora a morte do pai, da mãe ou de outro membro da família. Enquanto um casal festeja e conta para todos o bom desempenho do filho, ou da filha, no vestibular, no curso que tanto sonhou, outro casal chora ao ver o filho todo machucado, em cima de uma cama, - ou ainda sem vida - vítima de um acidente de trânsito ou de violências diversas.
            É certo que os fatos da vida vão continuar assim, nesses contrastes inevitáveis. Não há como ser diferente. Mas há, sim, como ser diferente, a maneira como lidamos com isso. Apesar de não podermos evitar a dor do nosso semelhante, podemos demonstrar nossa solidariedade e compaixão por ele nos momentos de escuridão. Quem sabe podemos, também, ser mais comedidos em nossas manifestações de euforia ao perceber que alguém está sofrendo ao nosso lado? Não há nada mais degradante do que sofrer sozinho. Estar no limite da dor e ver festejos e risos ao nosso lado.
            Como bons cristãos, aprendamos com Jesus a nos compadecer do outro. A ajudá-lo como o bom samaritano. Fazer com que ele se sinta amparado. Às vezes basta um abraço para devolvermos a dignidade a alguém que passou por uma ocasião de agonia e não sabe como sair do marasmo e da tristeza que domina sua alma. Se Jesus nos dá forças para suportarmos nossa própria dor, podemos aproveitar essa graça para fortalecer o irmão que sofre ao nosso lado e mostrar-lhe que ainda há muita coisa para ser feita em nome de Deus e que todos devemos dar a nossa contribuição. Assim, com a dor repartida, o sofrimento será menor. Com a graça de Deus. 
Luisa Garbazza

              Com essa crônica, deixo meu agradecimento, minha homenagem e meu reconhecimento ao amigo, Laender, pessoa ímpar e íntegra, que nos precedeu na partida para a casa do Pai.
    Deixo, também, meu abraço e minha solidariedade sincera à amiga Aninha, cuja dor imensurável não passou despercebida. Foi compartilhada por muitos que, como eu, a admiram e a querem bem.
Aninha, Deus lhe conceda a força necessária para você continuar, com dignidade, apesar das dores da alma, sua missão de mãe, de cristã, de profissional, de amiga...
Receba o nosso carinho e conte sempre com nossa amizade.
Luisa Garbazza

Publicação no Jornal  "Paróquia Nossa Senhora do Bom Despacho"
Março de 2014 

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