quarta-feira, 25 de março de 2020

Metamorfose




Metamorfose

O tempo, que se divide e se faz vida,
ao vê-la assim, sem graça, dividida,
sem um porto onde se ancorar,
vai, sem rumo, sem meta, sem saída,
sem chegadas ou partidas,
passo a passo a vagar.

Percebe, em cada tristeza sentida,
que a alegria ficou perdida
nos paradoxos do existir.
Busca forças, procura alguma saída,
como Coralina recriar a vida,
cuidar da raiz, e se renovar, e se sentir.

A vida se faz tempo agora,
sente a chuva, o sol que a face cora,
percebe o caminho, a ânsia de ressurgir.
A cada noite, revive o que foi outrora,
vendo a lua que clareia muito afora
e, pela janela, o quarto de dormir.

Guarda no peito lembranças das primícias,
sente, no rosto, do filho as caricias,
transforma em poema a vida de então.
Dá passos largos, sem dor, sem malícia...
A face revela a beleza e a essência
de quem leva o mundo na palma da mão.

Luisa Garbazza
                                   Bom Despacho, janeiro de 2020



sábado, 7 de março de 2020

Vida: dom de Deus


Em comunhão com toda a Igreja do Brasil, estamos vivenciando a Campanha da Fraternidade 2020, que nos trouxe um tema tão necessário em nossos dias: Fraternidade e vida: dom e compromisso. Reconhecer a vida como dom de Deus é o primeiro passo para que possamos respeitá-la em sua totalidade. Nesse intuito, precisamos aprender a respeitar a nós mesmos, a todos os que cruzam o nosso caminho e à Mãe Terra com toda a sua diversidade.
Com a finalidade de conhecer melhor os objetivos dessa campanha, nós, da Paróquia Nossa Senhora do Bom Despacho, estivemos reunidos no dia quinze de fevereiro. Ali, inspirados pela parábola do bom samaritano (Lc, 10,25-37), tivemos a oportunidade de perceber melhor nossa missão de filhos e filhas de Deus. Compreendemos que a vida é um dom recebido gratuitamente e, justamente por isso, temos o dever de vivê-la com responsabilidade. Precisamos ser sempre um samaritano na vida de alguém, pois, vez ou outra, também carecemos da ajuda de um.
Isso tudo parece ser tão lógico! São os ensinamentos de Cristo, aprendidos na infância, que devemos levar pela vida toda. Mas, infelizmente, nem sempre isso acontece. Estamos vivendo uma era de distanciamento. Valoriza-se muito o virtual. Muitos são os que se conectam aos celulares, alheios a tudo que acontece a sua volta. E ai de quem vier interferir naqueles momentos de ilusória conexão.

Falta de compaixão
Durante uma viagem em família, tivemos o desprazer de presenciar uma cena dessas. Bem próximo a nós, aproveitando o sol da manhã, um casal e um filhinho de uns três anos. O pai sentado de um lado, a mãe do outro. Ambos de cabeça baixa, desligados do mundo, hipnotizados pelas telinhas dos celulares. O menino estava inquieto. Andava aqui e ali, e não encontrava seu lugar. Pegava um brinquedo, mas não queria brincar sozinho. Aproximava-se do pai e, em vão, tentava ganhar-lhe a atenção. Passava do outro lado e a cena se repetia com a mãe. Pareciam nem ter consciência da presença do filho. Em um momento de desespero, como uma súplica ao pai, o menino se aproximou, pegou um punhado de areia e levou-o à boca. Numa fração de segundos, agindo por reflexos, sem nenhuma compaixão, o pai levou a mão e deu um sonoro tapa na criança, que, no mesmo instante, soltou o choro. O pai retomou a consciência, tomou o filho no colo e acalentou-o para que parasse de chorar. A mãe, que assistia passivamente à cena, abriu automaticamente a bolsa, lançou mão de um terceiro celular. Colocou o menino na cadeira e entregou-lhe o aparelho. A visão tornou-se mais triste ainda: os três juntos, mas, ao mesmo tempo, tão distantes. E assim continuaram por um longo tempo.

Essas lembranças nos ajudam a entender o sentido desta Campanha da Fraternidade. O lema "Viu, sentiu compaixão e cuidou dele" (Lc 10,33-34) é a proposta de vida para cada um de nós. Temos o compromisso de cuidar da vida. E isso implica viver em fraternidade, cuidar uns dos outros atentos às necessidades de cada um. Igualmente respeitar os animais e a natureza, criaturas de Deus.
Essa crônica é também um convite a todos nós, para que nos deixemos sensibilizar por essa campanha e nos comprometamos a ajudar os irmãos necessitados. Todos somos filhos de Deus, e Ele não deu privilégios a nenhum de nós. Ninguém tem o direito de viver bem em detrimento a tantos que sofrem. Caminhemos juntos.
Luisa Garbazza

Jornal Paróquia Nossa Senhora do Bom Despacho
Fevereiro de 2020