domingo, 1 de junho de 2014

Efêmera liberdade

         Primeiro de junho. Aniversário da cidade. Bom Despacho completa 102 anos. Logo pela manhã, bom-despachenses de todos os cantos – geograficamente falando – dirigem-se ao centro da cidade para participar das atividades comemorativas. Na Rua Dr. Miguel Gontijo, o desfile cívico, que encanta os olhos com suas cores, movimentos e sons: polícia militar, tiro de guerra, grupo de escoteiros, escolas, secretarias diversas – cultura, saúde, esportes – e tantas outras atrações. Desfilo pela Paróquia, com a Pastoral Familiar.
Quando terminei de desfilar, olhei para o alto da rua, ainda cheia de pessoas e cores, mas, já cansada pelas horas de espera sob o sol quente, desisto de permanecer no local e desço de volta para casa.
Ao abandonar a rua principal, já distante dos sons típicos de desfile cívico-militar, percebo a diferença nos ares. Entro na Rua Palmital – onde fica minha residência. A rua é ampla e comprida. Do alto, vejo bem toda a sua extensão. Não é uma rua muito movimentada; está, no entanto, mais erma ainda. Nenhum movimento, ninguém nas ruas, ausência total de sons.
Em um instante de loucura, dirijo-me ao centro da pista, marcado com traços amarelos. Uma sensação de liberdade se apodera de minha mente. O vento ajuda com suas lufadas, leves – de boas-vindas –, depois fortes – incentivando minha “loucura”. Como se me ajudasse na brincadeira, dava-me asas, levantando-me os cabelos e propiciando momentos de leveza, de amplitude, de êxtase.
Continuei minha caminhada, pisando levemente o asfalto com as pontas dos pés, como se fosse levantar voo a qualquer momento. A rua continuava completamente vazia. O silêncio, quebrado apenas pelo ruído das folhas sendo levadas pelo vento, ou pelo latido de algum cão, invadia tudo, reinava absoluto, dando a mim a sensação de que estava sozinha no mundo. Olhava ao longe e ninguém havia para quebrar aquele encantamento. Os passos agora, tal qual os de uma dançarina, eram delicados, vagarosos e cadenciados. O coração, que sabe responder prontamente a cada emoção, estava em festa: inquieto, enchia o peito e sorria como criança. O rosto, feliz, também se iluminou. E por alguns instantes, era somente eu, numa valsa embalada pela doce brisa.
Desci toda a rua nesse ritmo agradável e único. Às vezes, por precaução, olhava para trás para certificar-me de que o trânsito estava mesmo ausente, ou se alguém me olhava com ares de censura. Tarefa necessária, mas inútil. Nada, nem ninguém, veio atrapalhar meu devaneio nesta manhã fria de domingo.
Mais próximo de casa, afastei-me do meio da rua e aproximei-me da calçada. Atitude sensata, pois havia um entroncamento, apesar de a outra rua também se encontrar deserta. Antes de entrar, dei uma última olhada para o alto da rua. Ainda conservava sua liberdade. Poderia servir de palco para outras façanhas de algum coração pleno de vida.
Luisa Garbazza
Manhã de domingo - 1º de junho de 2014

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