segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Reinventando a vida (Crônica)

A cidade desperta bem cedinho. Principalmente para aqueles que começam a lida logo de manhã. O trabalho compromete as pessoas que não podem se dar ao luxo de escolher as condições de tempo nem temperatura para isso. E não são poucos os que se levantam, mesmo antes do sol, para iniciar um novo dia.
Também me enquadro nessa turma. Saio de manhã, sempre antes das sete horas. E no início do meu dia, gosto de observar os que passam. Uns apressados, outros contando os passos; uns sozinhos, outros em duplas ou grupos que conversam animadamente nas primeiras horas da manhã. Adultos, que se encaminham para o trabalho; alunos, que se dirigem para a escola; mães, levando os filhos para a creche; enfim, a cidade acorda.
Um acontecimento matinal que me chama a atenção na rua é a rotina do lixo. Quando saio, percebo a calçada repleta de sacos com os detritos. O caminhão sempre passa para recolhê-lo, mas como cada morador coloca suas sacolas em frente de casa, fica difícil para os trabalhadores de limpeza urbana sair correndo atrás do caminhão, recolhendo cada uma. Então, um deles passa, logo cedo, recolhendo as sacolas e reunindo-as em pequenos montes, para facilitar o trabalho do “caminhão de lixo”. Esse ato sempre coincide com minha saída de casa. Umas vezes um pouco antes, outras vezes logo após, mas ele está sempre lá.
Outro dia, saí de casa e presenciei uma cena tão inusitada, que me causou uma grande admiração. A rotina do recolhimento das sacolas de lixo era a mesma. A maneira de fazê-la era no mínimo curiosa. Um rapaz fazia seu trabalho com o auxílio de uma moto. Sim. Recolhia o lixo de algumas casas, subia em sua moto e avançava um pouco mais além. Recolhia outras sacolas e, novamente na moto, adiantava-se mais para frente na rua. E assim, subia, repetindo o processo rua acima até sair do meu ponto de observação.
No outro dia, ao sair, lembrei-me da novidade e olhei rapidamente para o início – ou o fim? – da rua. Lá estavam eles: o lixeiro e sua moto. Da mesma forma, recolhia o lixo, daquele modo tão peculiar, e seguia pela rua repetindo o gesto.
E por vários dias essa cena se repetiu. Assim que pisava a calçada em frente de casa, olhava para a direita, por onde o lixeiro costumava subir, e lá vinha ele: o motoqueiro lixeiro. Ou o lixeiro motoqueiro? Não importa. O que chamou minha atenção foi a criatividade que aquele jovem utilizou para aliviar um pouco sua faina diária. De alguma forma ele se destacou dos outros que fizeram esse trabalho antes dele. Isso deve ter feito uma diferença enorme no final de sua jornada.
Achei tão interessante esse “quadro” que se desenhava dia após dia em minha rua, que cheguei a comentar com algumas pessoas sobre a singularidade dele. Depois, como iniciaram as férias escolares, parei de sair pela manhã e não acompanhei mais a rotina daquele trabalhador.
Pude refletir, a partir daquele quadro, a importância do trabalho de cada um. Todo trabalhador tem o direito de receber as condições necessárias para bem executar seu serviço. E deve ser tratado com dignidade, seja qual for a função que desempenha.
Esse acontecimento ficou em minha mente e sempre volta com outros pensamentos. Fez-me perceber que podemos aprender e reaprender a cada dia. O que eu fiz hoje e não foi satisfatório, posso fazer amanhã de outra forma. Usar métodos diferentes, colocar mais energia ou mais sensibilidade, envolver-me mais no processo ou mesmo ter a humildade de pedir ajuda a alguém (ou algo) que possa suprir minhas deficiências.
Luisa Garbazza
07 de agosto de 2011

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