Estamos em pleno século XXI: era da modernidade, da pressa absoluta, do
mundo virtual. As pessoas não ficam mais sozinhas. Olho para elas nas ruas, nos
bares, nas festas. Nunca estão sozinhas. Mas não estão sozinhas porque estão umas
com as outras. Estão, sim, em companhia de sua excelência: seus celulares. Ou similares.
Cada um ostentando seu aparelho, contando vantagens, querendo ser superior ao
outro.
Bom! Isso já não causa tanta estranheza assim. Já está até dentro da
normalidade. Seja novo ou velho, criança ou adulto, rico ou pobre, o produto de
primeira necessidade é o celular. O que sempre causa estranheza às pessoas é a
minha aversão por celulares – esse vírus que contamina, cada vez mais, a
sociedade moderna. Não suporto a tal companhia. Chego a sentir certa fobia da
coisa.
Andando pelas ruas, constrange-me ouvir assuntos que vêm saltando pelos
ares, normalmente numa voz mais alta que o necessário, talvez para mostrar que
também está em sintonia com essa era pós-moderna: “Não! Eu falei com a
professora dela que eu não queria ela sentada perto daquele menino!” “Sabe
quanto ele recebeu quando saiu de lá? Você nem vai acreditar?” “Ele saiu com
aquela maldita ontem. Nem sei o que vai acontecer agora.”
Outro dia, passei perto de uma mulher que estava limpando a calçada. Cumprimentei-a,
por educação, e passei adiante. Ouvi então ela dizendo: “Você sabe o que está
acontecendo lá embaixo?” Virei no mesmo instante para dar atenção a ela. Vi que
continuava varrendo a calçada, de costas para mim. Percebi que o celular estava
no bolso, e um fiozinho tênue, passado pelo pescoço, sustentava um fone de
ouvido e um pequeno alto-falante. O interlocutor era outro. Segui adiante
indignada.
E aqueles que levam para a igreja ou salão de palestras e atendem os
celulares ali mesmo, sem quaisquer constrangimentos? ”Alô! Oi! Estou no Salão
São Vicente. Não. Tô numa palestra.” E nas pizzarias? Várias pessoas ao redor
da mesa. Aparentemente, estão juntas. Em instantes, cada um começa a manusear
seu celular. Estão em mundos diferentes. Melhor seria nem sair de casa.
Todas essas situações causam-me um desconforto imenso. Sou dessas pessoas
mais reservadas. Não me imagino conversando e sendo ouvida por desconhecidos,
estranhos, transeuntes. Não consigo absorver essas situações. Apesar disso,
habituei-me, com certo grau de reserva, a ouvir frases soltas, pedaços de histórias,
reclamações, xingamentos e outras falas, mas, algumas vezes, a situação foge ao
meu controle.
Hoje, acompanhando meu filho a um consultório dentário para extração dos
sisos, passei por uma situação bem irritante: Assim que entramos no
consultório, logo após a secretária, entrou atrás de nós uma mulher. Regulava idade
com a minha. Mal se sentou, pegou o celular e começou a falar. Entendemos que
fosse com a irmã. No entanto não falava normalmente. Era uma fala alta, com uma
voz forte que enchia a pequena sala. Em poucos minutos, o médico chegou e meu
filho foi atendido. Fiquei só naquela sala com a tal mulher. O tempo passava e
ela não parava um só minuto. Falava da mãe, dos sobrinhos, dos cunhados, dos
problemas de família, das traquinagens dos meninos, das fofocas, da ceia de
Natal – onde vai ser, quem vai organizar, quem não gosta de participar – o que
pode ser falado com todos, o que deve ser “abafado”... E a lista é enorme.
Com um pouco de dor de cabeça, não consegui permanecer ali. Retirei-me com
ares de enfado, andei pelo corredor e sentei-me na escada, do lado oposto ao
consultório. Mesmo assim, ainda era possível ouvir o som de sua voz. Mas pelo
menos não dava para entender seus assuntos. Particulares?
Por isso, prefiro não me deixar escravizar. Enquanto a situação me
permitir, serei livre.
Luisa Garbazza
15 de dezembro de 2015
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