sábado, 9 de agosto de 2014

Quando a dor é nossa



Falar da dor do outro é fácil. Demonstrar solidariedade, levar um abraço, uma palavra amiga, fazer-se presente. Tudo relativamente simples. A dor do outro não pode ser medida, avaliada, sentida. Pode-se até, em poucos segundos, transformar o sofrimento alheio em poesia, palavras bonitas que emocionam e tocam o coração. Mesmo assim, a dor continua incompreendida em sua plenitude. Por mais que tentemos nos colocar no lugar da outra pessoa, imaginar-lhe o sofrimento e procurar amenizá-lo com palavras de conforto, não conseguimos abstrair o que realmente está acontecendo na alma alheia. Mas quando a dor é nossa, tudo é diferente.
Quando é nossa, a dor é sentida, experimentada, sofrida, pesada. Chega devagarzinho e, ao percebermos, já se instalou em nosso coração. É um sentimento incompreensível. Descrever em palavras o rosto das feridas da alma é algo completamente impossível. Nesses momentos, só nós mesmos somos capazes de perceber a dimensão da dor que perpassa nosso ser. Se existissem olhos capazes de enxergar o nosso interior, com certeza veriam o retrato desfigurado do infortúnio humano.
Em momentos de dor, sentimo-nos as pessoas mais miseráveis. Não conseguimos compreender, em sua totalidade, até onde somos capazes de suportar tamanha desventura. O rosto, mesmo transfigurado pelo sofrimento, não retrata fielmente os estragos que foram feitos por dentro. Nem as lágrimas, por mais abundantes que sejam, conseguem alcançar a tristeza que trazemos no peito. A fisionomia, carregada de desgosto, é o sinal de que a dor é quase insuportável.
Em recente situação de luto, pude perceber na pele o quão difícil é convivermos com a própria dor. Mesmo com toda a formação religiosa e com a certeza da ressurreição, esses momentos de extrema consternação são inevitáveis. A alma se torna frágil demais. Os pensamentos são alterados – quase todos são arrebatados para o passado – e revivem as lembranças, lamentando as oportunidades perdidas, projetando o vazio da vida pós-perda. Por vários momentos, perdemos até a capacidade de rezar. Qualquer palavra dirigida a Deus é motivo para aumentar ainda mais o peso da dor. O vazio que sentimos no peito se transforma em nova cascata de lágrimas que nos turva os olhos, inunda o rosto e abafa a voz.
Entretanto, não estamos sozinhos. Deus, em sua suprema sabedoria e bondade, coloca pessoas ao nosso lado, alguém para nos acompanhar e suprir nossas deficiências nessas ocasiões de aflição. Foi o que aconteceu comigo e minha família. No momento de grande desespero, pela perda de nossa mãe amada, quando as forças já não correspondiam às necessidades e a alma demonstrava sua fragilidade, sentimos a ação divina na presença das pessoas amigas que nos ajudaram. Foram anjos que Deus colocou em nosso caminho para nos aliviar o peso da solidão e do silêncio que retratava o que ia-nos na alma. Anjos que nos dirigiram palavras amigas de conforto e confiança em Deus e transformaram aquele lugar em um ambiente de constante oração. Anjos que se revezaram e foram incansáveis em seu papel de samaritanos.
Assim, quando a dor é nossa e sentimos o calor humano que nos cerca, devemos valorizar a presença dessas pessoas que receberam de Deus o dom de fazer-se presente, de aproximar-se e estender a mão aos que sofrem. Pessoas que sempre encontram um tempo para deixar-se ficar, para entoar um canto, rezar o terço de Nossa Senhora, lembrar-nos, através de palavras carregadas de fé, a presença e o amor de Deus em todos os lugares, em todos os momentos da vida. E que essa mesma misericórdia nos acompanha depois da morte. Pessoas que, pela constância de sua missão, merecem nosso reconhecimento, e nossa gratidão mais profunda. Deus lhes pague.
Luisa Garbazza

Publicado originalmente no Jornal Paróquia
Paróquia Nossa Senhora do Bom Despacho, agosto de 2014.

Nenhum comentário:

Postar um comentário