Na história da humanidade, é grande o número
de pessoas que atenderam ao chamado de Deus. Ouviram a voz divina e a colocaram
em prática mesmo sem entender seus objetivos. São exemplos de pertença e
entrega total ao Criador de todas as coisas. É Abraão preparando o sacrifício
de seu filho Isaac; Salomão com sua sede de sabedoria; Maria com seu sim – “Eis
aqui a serva do Senhor!”; os discípulos que largaram tudo para propagar a
boa-nova de Jesus; São Paulo, que se converteu em plena perseguição aos
cristãos; e tantos outros que entregaram até a própria vida para que os
ensinamentos divinos prevalecessem entre os homens.
Essa missão de semear a luz divina entre os
povos e propor um modelo de vida mais humano e fraterno fez e ainda faz parte
da vida de muitas pessoas que se entregam parcial ou integralmente a serviço do
reino de Deus aqui na terra. "Se queres ser perfeito, vai, vende os teus
bens, dá o dinheiro aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois, vem e
segue-me". (Mateus – 19,21) Para muitos, esse é o único caminho capaz de
preencher as lacunas causadas pelo anseio de Deus.
Foi esse o exemplo que nos deixou o saudoso
padre Júlio Maria De Lombaerde, “missionário que veio de longe” e fundou, entre
tantos outros, a Congregação dos Missionários Sacramentinos de Nossa Senhora,
cujo carisma, nós bom-despachenses, conhecemos tão bem.
Júlio Emílio – seu nome de batismo – nasceu
na aldeia de Beveren, na Bélgica, dia 7 de janeiro de 1878. Era filho de José de Lombaerde e Sidônia
Steelant. Antes de concluir seus estudos, sentiu o chamado de Jesus: “Vem e
segue-me.” Foi
atraído pela vida missionária e serviu a Deus na África, na Holanda, França e
Brasil. Escolheu a vida religiosa consagrada e com muito entusiasmo viveu em
comunidade obedecendo aos votos de pobreza, obediência e castidade.
Sacerdote do ‘‘Amor Sacrifício’’, padre Júlio
Maria, nome que ele mesmo adotou por amor a Maria, foi transferido para o
Brasil em 1912. Não conhecia o Brasil nem a língua portuguesa, mas obedeceu
confiando inteiramente em Deus e em Nossa Senhora e não mediu esforços para bem
cumprir sua grande missão de anunciar o Evangelho de Cristo através de Maria e
da Eucaristia.
Começou seu trabalho missionário em Macapá (1913)
com um povo carente em todos os aspectos. Não bastava evangelizar. Ele, que
viera “salvar almas”, não só rezava muito, celebrava missa e dava catecismo
para crianças, jovens e adultos, mas também cuidava da saúde, da instrução e da
alimentação daquele povo tornando-se amigo de todos. “Desse modo, ele era o médico, o farmacêutico, o mestre-escola, o amigo
e pai dos pobres, o encanto das criancinhas.”
Ali fundou a Congregação das Filhas do Coração
Imaculado de Maria – irmãs que cuidavam da educação e formação geral das
crianças abandonadas. A urgência daquele povo sofrido falou mais alto, porém a
ousadia de criar uma congregação sem aprovação prévia da Santa Sé lhe causou
enorme sofrimento. E quanto mais padecia, mais crescia a adoração a Jesus
sacramentado, o espírito de oração e o amor ao sacrifício.
Do norte do Brasil, seguiu para o sul de Minas para
concretizar um sonho: fundar uma Congregação masculina de padres e
missionários. Conseguiu, após muita luta e paciência, concluir seus planos, em
Manhumirim – MG, aonde chegou dia 24 de março de 1928. Deixou como herança na
cidade a Congregação dos Missionários Sacramentinos de Nossa Senhora – que
ainda em seu tempo se expandiu para outras terras, inclusive em Bom Despacho; a
Congregação das Irmãs Sacramentinas de Nossa Senhora; o jornal O Lutador; o
Patronato Santa Maria (para acolhimento dos órfãos); o Seminário Apostólico; e outros.
Foram trinta e quatro anos de trabalho missionário
em nosso país. A semente foi lançada. O semeador partiu para junto do Pai. Faleceu
em um trágico acidente de carro, dia 24 de dezembro de 1944, pronunciando as
palavras: “Meu Deus, meu Deus! Nossa Senhora do Carmo! Meu Deus!” Por tudo que
viveu, fez e ensinou, “É bem pouco pra ti sepultura / Necessário se faz um
altar”. “O Pe. Júlio Maria De Lombaerde,
foi, sem dúvidas, um santo que marcou o seu tempo. Foi um homem profundamente
entusiasmado com o que fazia. Aspirava com todas as forças do seu coração salvar
as pessoas para Cristo, atraindo-as aos pés de Jesus Eucarístico pela materna
intercessão de Maria Santíssima, a quem chamava e ensinava a chamar de Nossa
Senhora do Santíssimo Sacramento.”
Hoje, cem anos depois de sua chegada ao Brasil,
data que está sendo comemorada com o devido merecimento, o Ideal Julimariano
ainda contagia muitos cristãos. Neste “momento de glória”, relembramos e
reavivamos a chama deixada por esse missionário arrebatado pela Eucaristia e
enlevado pela Virgem Maria. Assim, pela coragem em transpor continentes e
barreiras; pela determinação em difundir o amor a Jesus e Maria; pelo trabalho
incansável servindo de exemplo a ser seguido; pela fé na providência divina;
pela vida de sacrifícios, de pobreza, desapego e humildade; e por seu coração
tão generoso, “o nome do Padre Júlio Maria, há de ser, para sempre, relembrado
na história”.
Luisa Garbazza
Julho de 2012
Crônica originalmente publicada no jornal "Paróquia"
Paróquia N. S. Do Bom Despacho
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