sexta-feira, 13 de abril de 2012

Tenra idade


A infância, uma fase mágica da vida, está sempre se fazendo presente, por toda nossa vida, em lembranças constantes que não se esgotam nunca. Quando essa foi povoada de momentos felizes, volta em forma de alegria que provoca risos interiores e enternece o coração. Mas, se, ao contrário, foi marcada por acontecimentos difíceis, gera traumas tão intensos que chegam a atormentar por anos e anos.
Atualmente presenciamos uma preocupação muito grande com as crianças através da mídia. Os primeiros anos da história de cada um deve ser uma fase de descobertas, de brincadeiras, de alegrias, de encanto. Recordo os meus, vividos em um pequeno sítio, às margens de um córrego de águas limpas, que brincavam com os acidentes da natureza, ora formando pequenos lagos, ora caindo verticalmente formando pequeninas quedas-d’água ou ainda correndo serenamente por entre as pedras. Em uma família de muitos irmãos, nunca faltava companhia para brincar, estudar ou ajudar em alguma tarefa. Dali ficaram eternizadas em minha memória muitas aventuras, alegrias e sonhos.
Infelizmente, para muitas crianças, essa é uma fase marcada por maus-tratos, miséria e tristeza, por todo o país. Vez ou outra, o caso de uma criança sendo oprimida congestiona os meios de comunicação e provoca uma avalanche de opiniões, críticas, revoltas. Porém, constato que poucos casos são registrados, explorados ao extremo, enquanto outros, muitos, passam despercebidos, sem alarde, sem “incomodar” ninguém.
Em recente viagem ao litoral, presenciei um fato que me causou indignação. Entre os ambulantes que circulam pela praia – e que deveriam ser devidamente cadastrados e licenciados – chamou-me a atenção a figura de um menino. Com seus dez, onze anos, sugeridos pela estatura, a pele escura, maltratada pelos raios escaldantes do sol e a cabeça desprotegida, vendia bolsas. Não algumas bolsas. Um emaranhado de bolsas femininas de todos os tipos, cores e tamanhos. Tantas, que enchiam um suporte que ele trazia pendurado no pescoço e pendia de um lado imobilizando seus braços. Do outro lado, o peso incontrolável das bolsas puxava-as para a areia onde se arrastavam constantemente.
Foi dolorido observar o semblante daquela criança. Um olhar triste, demonstrando cansaço, já nem falava nada. Passava de um lado para outro, jogando as bolsas de qualquer maneira tentando equilibrá-las nos ombros. Era visível o descontentamento do menino. Vender bolsas não deve ser o sonho de nenhum garoto. – Se pelo menos fossem algumas bolas coloridas!...
E, por várias vezes naquela manhã, a presença marcante de tão inusitado personagem veio perturbar meus pensamentos. Impossível não pensar nesse momento na desigualdade social. Na má distribuição de rendas em nossa sociedade. Enquanto algumas crianças têm tanto, vivem mergulhadas no luxo, no desperdício, muitas vivem no limite e outras sofrem, batalham e conseguem apenas o suficiente para sobreviver. Os sonhos de criança? Ficam camuflados no vaivém cansativo do dia a dia.
O desejo que brotou no coração depois disso, embora um pouco utópico, foi de uma sociedade mais justa, pelo menos com os pequenos. Toda criança tem direito ao lazer e a ser protegida contra o abandono e a exploração no trabalho, já diz a Declaração Universal dos Direitos da Criança. Toda criança tem o direito de ser amada e feliz. Acima de tudo, precisa de um incentivo a mais para se desenvolver sadiamente e fazer reservas de sonhos para suavizar a realidade da vida adulta. 
                                                                                                                                           Luisa Garbazza
* Crônica publicada originalmente no jornal 'Paróquia', da Paróquia Nossa Senhora do Bom Despacho, no mês de abril de 2012.)
 

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