sexta-feira, 2 de março de 2012

A efemeridade da vida

      Certos momentos na vida, que no princípio parece rotineiro, tomam uma proporção inimaginável e confundem nossas convicções mais consagradas. Foi o que aconteceu comigo em uma visita ao Asilo. Serviria apenas ao cumprimento de um propósito feito por um grupo de oração. Porém, o que aconteceu foi de uma dimensão inesperada. E deixou marcas que dificilmente serão esquecidas.
      Manhã de sábado. Chegamos ao local sem saber o que fazer ou a quem procurar, pois não havíamos combinado nada nem marcado horário. Vários idosos estavam no pátio da frente “tomando” sol. Aos poucos, fomos nos inteirando dos acontecimentos. Entregamos à coordenadora algumas coisas que levamos para os internos. Cumprimentamos uns, conversamos com outros, sem muita intimidade. Seria apenas uma visita rápida. Mas Deus nos reservou algo mais profundo.
      Poucos minutos após nossa chegada, apareceu também um conhecido nosso para prestar serviço voluntário. Conversando, ele nos contou que ia sempre, aos sábados, para ajudar nos cuidados para com os “velhinhos”, principalmente com a higiene pessoal. E convidou-nos para ajudá-lo. Aceitamos o desafio e o ocorrido deixou-me emocionada.
      Começamos a cortar as unhas dos velhinhos e lixá-las para “não agarrar nos cobertores” como nos disse um deles. Eram mãos e pés cansados, quase sem movimento e frágeis. Tinham que ser manuseados com cuidado. Um jovem, também prestando trabalho voluntário, fazia a barba dos homens e fomos orientadas a aparar os pelos das sobrancelhas e orelhas, que incomodam muito. Eles agradeciam, contavam algo sobre suas vidas, sorriam em reconhecimento. Outro voluntário chegou com um violão e pôs-se a cantar alegrando o ambiente. Alguns até arriscavam a cantar junto.
      Em dado momento, parei um pouco e comecei a observar aquelas pessoas. Não pude controlar a emoção. As lágrimas vieram fáceis aos meus olhos. Alguns estavam tranquilos, serenos, conversando. Outros repetiam a mesma frase sem parar: “Fazer a barba.” Uma mulher andava de um lado para outro com um cigarro na mão. Um fazia questão de deixar bem claro que não gostava dali, achava muito barulhento e ele gostava de silêncio. Havia os que permaneciam alheios aos acontecimentos, não tinham mais consciência do que estava acontecendo. Num canto mais isolado, em uma cadeira de rodas, uma mulher chorava a ausência do filho que há muito não a visitava. Estava inconsolável. Coração doeu no peito. Afinal, os pais merecem respeito em qualquer fase da vida. Honrar pai e mãe não é só na catequese, é para a vida toda.
      Percebi que havia muita tristeza camuflada naquele lugar. Meu Deus, como o ser humano pode acabar assim? Depois de tantas lutas, anos de peleja, filhos criados às vezes com muita dificuldade, acabar assim, sozinho, isolado, abandonado. Por melhores que sejam as condições do lugar, por mais paciência que os cuidadores tenham, não vale por uma família, mesmo a mais simples. Por mais bem tratados que estejam, as lembranças de uma época em que eram capazes de dirigir a própria vida é inegável. Pude constatar isso em muitas lágrimas que percebi escorrendo silenciosas em faces marcadas pela melancolia.
      Os sentimentos que me invadiram foram de tristeza e impotência diante dessa adversidade. Isso tudo me fez sentir a urgência de sabermos valorizar mais as pessoas com as quais nós convivemos. Reconhecer a efemeridade da vida é motivo mais que suficiente para pensarmos melhor em nossas atitudes e decisões. Não sabemos o que vai nos acontecer no futuro, quais as dificuldades que o mundo se encarregará de trazer até nós. Por isso, cada pessoa merece nosso respeito e nossa consideração, seja ela criança, jovem ou idosa. Assim estaremos plantando sementes de amor e misericórdia para colhermos quando for a nossa vez de necessitar de alguém que nos conduza. 
                                                             Luisa Garbazza    29/02/2012

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