segunda-feira, 10 de junho de 2013

Junho de outrora

Todo ano, junho mostra a que veio apresentando-se, para muitos, como “o mês dos santos juninos”, “mês das quadrilhas”, “mês das fogueiras”, “mês das festas juninas”...  Para outros, junho tem ar de saudade e torna-se carregado de recordações. Volta-se à tona uma nostalgia boa dos tempos de outrora em que tudo era vivido com mais cautela, mais significado e respeito a Deus.
Apesar do frio quase insuportável que fazia, esse mês era um dos mais esperados do ano, principalmente pelas crianças. As datas em que se comemoravam os santos – Santo Antônio, São João e São Pedro – eram aguardadas com entusiasmo renovado. Cada uma delas era celebrada com bastante alegria, normalmente, em casas diferentes pela vizinhança. Minha mãe sempre era convocada para ajudar nos preparativos e “puxar” a reza do terço. Dona Maria sempre estava disponível para colaborar, seja qual fosse a tarefa. Doação total. Não media esforços pelo bem do próximo e pela glória de Deus. Em sua própria casa, ela gostava de festejar São Pedro.
O dia vinte e nove de junho (São Pedro) sempre amanhecia em festa. A participação nos dias treze (Santo Antônio) e vinte e quatro (São João) servia para aumentar a expectativa para esse dia. Logo pela manhã, a meninada, como formiguinhas, esmerava-se na tarefa de limpar bem o terreiro – enorme – que serviria de salão, para receber os convidados. Os mais velhos – ou mais fortes – saíam pelos campos recolhendo paus para serem usados na montagem da fogueira. Tudo, naquele dia, era feito em função do acontecimento da noite.
Uma das tarefas que Dona Maria fazia com primor especial era a confecção da bandeira para ser içada após a oração. Não tinha pressa. Comprava papéis coloridos, dias antes, preparava um quadrado de madeira fina, cobria com um tecido branco e colava ali a estampa do santo. Depois ia confeccionar os enfeites. Recortava cuidadosamente as tiras de papel colorido e, com toda sua criatividade, adornava a bandeira formando delicadas flores e mosaicos multicores. Então, cortava outras tiras, dobrava-as bem dobradinhas para dar um efeito diferente quando desmanchasse as dobras. Pendurava-as na base da bandeira deixando-as soltas e livres. Verdadeiro trabalho de artista. Ficava tão linda que muitas famílias traziam suas bandeiras para ela ornamentar, o que ela fazia com alegria, gosto e presteza.
Quando escurecia e a noite se adiantava, começava a chegar os vizinhos. Acendia-se a fogueira para iluminar a noite escura e aquecer o lugar. Os vizinhos iam se chegando, procuravam um lugarzinho para se acomodar e aguardavam o momento da “reza”. Nesse momento, também, era a Dona Maria que se colocava a serviço. O terço era rezado de uma maneira bem cuidadosa, piedosamente. Ela tinha o dom de motivar as pessoas para aquele momento sagrado mostrando o valor do recolhimento e do respeito pelas coisas de Deus. Não se via ninguém movimentando, não se ouvia barulho, conversas nem gracejos. Todos se concentravam em louvar a Virgem Maria e pedir a intercessão de São Pedro.
Terminando a oração, vinha um momento muito aguardado: hora de levantar a bandeira, que já se encontrava fixada na ponta de um bambu bem alto, cuidadosamente escolhido para aquele lugar de honras. Ao som do “Bendito, louvado seja” a bandeira subia majestosa. As tiras coloridas, impelidas pelo vento, começavam seu bailado multicor, contribuindo para a culminância daquela homenagem. Seguia-se, então, um “Viva São Pedro” e uma salva de palmas, intensificando aquele gesto de louvor.
Depois de cumprido o compromisso com Deus, acontecia uma agradável confraternização. Alguma coisa para comer e beber, as conversas em volta da fogueira, as brincadeiras de roda, os casos – muitas vezes assustadores – contados pelos mais velhos.
Momentos depois, a noite já alta, a lenha crepitando timidamente na fogueira quase apagada, as pessoas iam se despedindo e todos se recolhiam. A bandeira ficava ali, impondo sua presença a todos que passavam. No coração permanecia uma lembrança agradável e a esperança de que o próximo ano chegasse bem depressa e tudo fosse vivido novamente, com os mesmos detalhes, com o mesmo entusiasmo e com a mesma fé.
                             Luisa Garbazza    

Publicado no Jornal "Paróquia" 
Paróquia N. S. do Bom Despacho
 em junho de 2013

           

Nenhum comentário:

Postar um comentário