Certos
acontecimentos na vida, esses que surgem do nada, sem nos darmos conta, causam
tamanho desarranjo que abalam consideravelmente nossa estrutura emocional.
Passei por um, bem nesses moldes, recentemente.
Vivi
as últimas semanas voltada quase exclusivamente para o encontro de casais. A
rotina muda, as atividades se intensificam, reuniões se sucedem... Quando
chegou o dia propriamente dito já estava cansada. Foram três dias muito frios
e, como tenho a saúde frágil, os resultados não foram muito positivos para mim.
Tive um forte resfriado, acompanhado por febres altíssimas que me derrubou.
Passei a noite de domingo e a segunda-feira com febre cada vez mais intensa. No
início da noite, o Flávio, meu esposo, levou-me ao hospital. Muito desagradável
a espera. Não tinha forças nem para manter os olhos abertos. Quando chegou a
minha vez, o médico examinou-me, passou-me para um quarto de observação e, na
manhã seguinte, para a internação.
Durante
a noite o médico pediu um exame de sangue e uma radiografia do tórax. Fez um
diagnóstico sugestivo de pneumonia e medicou-me adequadamente.
No
quarto do hospital foi horrível. Sentindo mal, muitas dores, febre, uma água
quente a escorrer-me pelos olhos, que era confundida com lágrimas, sem ânimo
algum e sozinha – não permitiram a permanência do Flávio. E o pior, uma
enxurrada de pessoas – enfermeira, técnica de enfermagem, nutricionista,
psicóloga, médico, acompanhantes de outros internos – todos com uma chuva de
perguntas que eu respondia com meias palavras, pois além de total debilidade
estava quase sem voz. O único refrigério foi a hora de visitas em que tive a
companhia do Flávio e do meu filho, Rafael.
Mas
a angústia havia apenas começado. À noite, ainda sem melhoras, estranhei a
chegada apavorada de uma enfermeira que começou a recolher minhas coisas de
maneira urgente e disse que ia me levar para outro quarto. Juntou tudo, retirou
o soro do suporte e saiu me puxando. Fui cambaleando, segurando aqui e ali,
tonta, até chegar ao novo destino – um quarto pequeno e estreito. Como não
estava em condições de questionar, limitei-me a deitar sem entender o que
estava acontecendo. “Você vai ficar aqui até descobrir o que você tem.” Ela
saiu, fechou a porta e retornou logo depois com um recipiente plástico. Passou-me
as instruções para colher secreções do escarro por três dias consecutivos, e
tornou a sair. Nesse momento entendi tudo: pensavam que eu estava com
tuberculose. Comecei a entrar em pânico, mas parei e tive a certeza de que esse
não era um motivo para preocupação. Graças a Deus eu não tenho essa doença. A experiência
nos ensina. Já tive outras crises iguais a essa.
Acordei
bem mais disposta no outro dia e colhi o material para exame. Mas tenho que confessar
que mesmo sabendo do erro no diagnóstico, passar o dia sozinha naquele quarto
foi bem desgastante. Um ventilador silencioso; um televisor falando sozinho;
uma janela com pouca abertura que se descortinava para outras iguais; e, em
frente à cama, uma parede neutra que me devolvia imagens que se tornavam reais
sempre que meus olhos se fechavam – delírios nos momentos de extrema fraqueza. Na
hora de visitas, o Flávio e o Rafael apareceram com máscaras causando-me certo
estranhamento.
Passei
o dia ali, quase sem assistência e sem medicamentos, pois o médico só apareceu
à noite. Acabei descontando nele todo o nervosismo e a angústia de um dia tão
obscuro.
O
dia seguinte não foi muito diferente. Apesar de receber assistência e medicação
devidamente, o lugar não ajuda. A porta fechada; a máscara em cada profissional
que entra; a placa na porta do quarto – isolamento; a cara das pessoas – dá
para perceber quando alguém abre a porta; a falta de visitas, que são barradas
na portaria. Até o Flávio e o Rafael foram barrados e tiveram que argumentar
para conseguirem chegar até mim. Constrangimento total.
Quando
o resultado do exame saiu – NEGATIVO, a música ganhou novos acordes. O discurso
mudou completamente. Porém, nada será suficiente para mudar os efeitos de uma
atitude tão imponderada.
Isso
também acontece em nossa rotina de vida. Muitas análises são feitas sem pensar.
Muitas palavras inconsequentes são ditas – ou mal ditas. E assim vamos deixando
para trás oportunidades de viver cada dia de maneira mais amena. Vamos perdendo
oportunidades de aproveitar as coisas simples da vida e enfrentar os obstáculos
com mais esperança e fé. Isso tudo vai ficando para trás em cada “diagnóstico
precipitado”, em cada palavra mal interpretada, em cada perspectiva perdida.
Luisa Garbazza – 25 de junho de 2012
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