Dos
caminhos percorridos nesta vida, as trilhas mais bem vividas são as do tempo de
criança. Cada passo dado, cada aprendizado, cada pegada deixada são traços de
alegria, real ou magia, guardados na mente. Tempo de brincadeira, de tudo a vez
primeira, de emoção verdadeira, que vai bordando a vida qual linha nas mãos da
rendeira. As meadas se entrelaçam e, de ponto em ponto, formam corpo, mente,
personalidade. É a infância, época de pureza, de ingenuidade, confiança plena,
sentimentos que traduzem a essência da vida e moldam o caráter.
Em caminhos
quase paralelos, a vida: um eterno aprendizado. A vivência da infância
acompanha-nos por toda nossa existência. Quanto mais vivemos, mais buscamos o
tempo áureo dos bordados, da época em que tudo se transformava em brincadeira,
mesmo em tempos de vida difícil, quando poucos eram os recursos.
Há! A minha
infância!... Eu a carrego comigo, guardadinha em meu coração. Cada meada de
linha, cada ponto, cada novo bordado trazem as cores da minha meninice,
permeada de escassez material, mas recheada de simplicidade e alegria. Vez ou
outra, abro as gavetas do tempo e envolvo-me naqueles pensamentos. O último foi
justamente a história de uma meada de linha...
Vejo-me na
escola, na terceira série do Ensino Primário – hoje Ensino Fundamental. A
professora, muito dedicada, criava formas diferentes e divertidas para atrair a
atenção da meninada. A que mais me encantava era o momento de “Contação de
História”, sempre de um jeito novo e em lugares diferentes. Certa vez, ela
pediu que, no dia seguinte, cada aluno levasse um tapete para a aula. Saí da
escola suspensa. Na precariedade da minha infância, mal sabia o que era um
tapete. Em casa não havia um sequer. Consequência: cheguei à escola de mãos
vazias. No momento mágico da história, a professora nos levou a um espaço
reservado no pátio da escola e pediu que todos colocassem o tapete no chão e se
sentassem. Ela fez o mesmo. Todos acomodados e eu em pé. Ela olhou a turma e
pediu a uma aluna, que levara um tapete bem grande, que me deixasse sentar
junto com ela. Permissão dada, aproximei-me timidamente. Não era um tapete
comum, era um tapete grande, bonito, todo brilhante, tecido com fios dourados.
Parecia o tapete mágico das histórias. Então me assentei, bem na beiradinha. Em
minha mente ingênua de menina da roça, a imagem logo se formou: “São fios de
ouro”! A voz da professora prendeu a atenção de todos. Menos a minha. Enquanto
ela contava a história – na qual não conseguia me concentrar, vislumbrada com o
tapete – comecei a puxar um dos “fios de ouro”, bem devagarinho, para que
ninguém percebesse. Cada fala, um puxãozinho. Na mente fértil, cheia de
imaginação, fui inventando maneiras de ostentar aquele cobiçado fio dourado. A
história já estava quase chegando ao fim – e eu também quase realizando meu
sonho de arrancar aquele fio – quando a menina percebeu e reportou tudo à
professora. Repreendida, levantei-me depressa, vermelha de vergonha, e fiquei em
pé até o fim da aula. O fio de ouro, ora inacessível, permaneceu apenas na minha
imaginação.
Depois de
tantos anos revivendo essa e outras lembranças, torna-se fácil constatar a
presença das marcas deixadas por tudo que vivemos na infância, tanto as marcas
que nos fazem sorrir quanto as que nos deixam entristecidos. Por isso, mesmo
sabendo serem inevitáveis algumas marcas profundas, não tão felizes, precisamos
nos atentar ao cuidado com as crianças. É preciso escolher as cores com
cuidado, cortar as meadas na medida certa, fazer as aparas. Oferecer momentos
de harmonia, encontro e magia, responsáveis por preencher de alegria os
bordados da existência. Amar é cuidar.
Luisa
Garbazza
Minha singela homenagem a você, criança!
Criança de corpo ou de alma, que brinca, vive, celebra.
Feliz Dia
das Crianças! Deus abençoe.
E a todos os professores:
Feliz Dia dos professores!
Delícia de texto!
ResponderExcluirAcho difícil, Luísa,que alguém não goste de ler o que Você escreve! Sinto como que Deus tenha transferido a Você o poder de abençoar enquanto escreve. Hoje, dia em que a Igreja nos recorda Santa Faustina, vejo em Você atualizado este projeto sagrado de secretária de Jesus.
Falando da infância, Você também nos leva a homenagear, na alma, nossos pais e tantos educadores!
Grande e muito agradecido abraço!
Amiga Lúcia
ResponderExcluirSinto-me lisonjeada com suas palavras. Deus a abençoe muito pela gentileza, pelo carinho e pela sutileza em seu comentário.
Abraço fraterno, cheio de carinho.