A tarde mostra ares de urgência. Na culminância do dia, as sombras chegam mais cedo, provocadas pelas nuvens densas e escuras que profetizam a tempestade iminente. Sem pressa, subo as escadarias da Matriz e busco refúgio – para o corpo e para a alma –, certa da presença de Jesus Eucarístico, que nos faz companhia por detrás do véu do sacrário, onde nossos olhos, humanos e pecadores, não podem penetrar.
Absorta, deixo meus pensamentos livres, passando por onde quiserem. Acompanho, com o olhar, a chegada de alguns irmãos que ali também buscam refúgio. É uma quinta-feira, dia eucarístico. O relógio anuncia que não tarda o início da adoração ao Santíssimo Sacramento. A alma se prepara: Vem, Senhor Jesus! Acalma meu espírito, relaxa meus nervos. Assim, em silêncio, com a alma em paz, acompanho o sacerdote ao nos apresentar Jesus Eucarístico, que se mostra no ostensório. Ali permanece à espera de nossa atenção, de nossas orações, do nosso olhar.
O coração se desmancha de amores. Apesar do véu, em meus olhos pecadores, que me impede de enxergá-lo, sei que Jesus se encontra ali, de braços e coração abertos, pronto para me ouvir. Começo minha oração lembrando o quão sedenta sou da presença eucarística. A fome de Deus preenche meu ser. A palavra fome desperta em mim a necessidade de rezar por todas as pessoas famintas, quer de alma – fome de Deus –, quer de corpo – fome de comida.
Na correria da vida, muitas vezes nos
esquecemos de olhar em volta e perceber as necessidades dos que nos rodeiam. Outras
vezes nos esquecemos de olhar com mais minúcias para nossas próprias
necessidades. Deixamo-nos levar pela rotina e, quando percebemos, sentimo-nos desnutridos,
com fome da vida espiritual, que nos pede momentos de oração e de escuta da
Palavra de Deus. Na presença de Jesus Eucarístico, tomamos consciência de que
somos os ramos presos à árvore, que é o próprio Jesus. Sem a seiva que vem de
suas raízes, não conseguimos sobreviver.
Pão para quem tem fome
A palavra fome, também remete meus pensamentos ao tema da Campanha da Fraternidade 2023, “Fraternidade e fome” e ao lema, “Dai-lhes vós mesmos de comer”. Diante de tantos irmãos nossos que não possuem o alimento necessário para viver com dignidade, a Igreja insiste na temática da fome. “Dar de comer a quem tem fome” é uma obra de misericórdia e, como tal, deveria merecer a observância de todos os que se dizem cristãos. Em vez disso, há tanta mesa sem pão, tantas famílias passando necessidade, tantos irmãos desempregados, sem condições de prover o lar.
É isso que a Igreja nos pede nesta Quaresma: para sermos fraternos e solidários, solícitos para com os que passam fome de pão, de justiça, fome de Deus. Cabe a nós refletirmos sobre o nosso papel nessa história. Peçamos a Deus coragem para identificar nossas próprias carências, para buscar sempre o alimento que vai nos fortalecer e, assim, estarmos preparados para levar ao outro o alimento para o corpo, mas também o alimento espiritual.
Na caminhada, preparemo-nos para a ação, em comunhão com a Igreja, em todo o Brasil, e peçamos ao Espírito Santo que inspire em nós “o sonho de um mundo novo, de diálogo, justiça, igualdade e paz”. Que Ele nos ajude a “promover uma sociedade mais solidária, sem fome, pobreza, violência e guerra” e nos livre “do pecado da indiferença com a vida”. Peçamos também a Maria, a Mãe da Eucaristia, que “interceda por nós para acolhermos Jesus Cristo em cada pessoa, sobretudo nas abandonadas, esquecidas e famintas”. Amém.
A melodia e o som do sino trazem-me de volta à realidade: “Tão sublime sacramento, adoremos neste altar”. É o momento propício para dar graças e louvores ao Santíssimo Sacramento e confiar em seu amor. A vontade é de Deus; a missão agora é nossa. Faça-se.
luisagarbazza@hotmail.com
Do Jornal Paróquia N. Sra. do Bom Despacho
Março de 2023
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