quinta-feira, 28 de março de 2013

Beleza na simplicidade


Nessas linhas retas que Deus traça em nossa vida, desviando-nos das curvas que insistimos em percorrer, deparamos com momentos inigualáveis que nos colocam frente a frente com as maravilhas de sua criação maior: o ser humano.
 Quinta-feira Santa, tudo combinado com meu esposo para participarmos da celebração na Igreja Matriz de Nossa Senhora do Bom Despacho. Já no final da tarde, recebi um telefonema da Adriana, agente da Pastoral da Comunicação da paróquia. Pediu-me, se possível, para eu participar da cerimônia do Lava-pés, que seria celebrada pelo Padre Rogério, Sdn, na Comunidade Nossa Senhora de Fátima, e fotografasse, para divulgação na internet. Pensei mil coisas ao mesmo tempo, mas não tive coragem de negar. Coloquei-me à disposição. Foi bem corrido, pois essa Igreja fica bem mais longe e nosso tempo estava restrito. Mas conseguimos chegar um pouco antes para interagir com o padre e os coordenadores da comunidade.
Ainda não tivera a oportunidade de participar da Santa Missa naquela Igreja. Foi uma experiência enaltecedora. Tudo ali primava pela simplicidade, sem deixar de ser impecável na essência. Em tudo, dava para sentir a presença divina: a acolhida fraterna que tivemos; a organização; a preparação do ambiente; a participação da assembleia; o carisma do sacerdote. Voltou-me à memória as palavras que ouvi certa vez do Padre Geraldo Mayrink: “Quanto mais simples a celebração, mais Deus aparece.” A certeza é  de que o Pai do céu estava ali conosco.
Durante a celebração, observando tudo e fotografando, um pequeno quadro se destacou perante meus olhos: no primeiro banco, três crianças – um menino e duas meninas – aparentando ter entre quatro e sete anos, participavam da Missa. Não estavam apenas ali na “Casa de Deus”. Rezavam, cantavam, acompanhavam cada movimento do padre de uma maneira tão concentrada que me comoveu. Durante toda a celebração, estavam atentos. Nos momentos de adoração, os joelhinhos dobrados eram sinal indicativo de uma sementinha de fé em pleno processo de germinação. Os olhinhos brilhavam sem se desgrudar do altar. Nada de conversas, nada de andanças pela Igreja, nada de implicância entre eles. A impressão que eu sentia é que eles sabiam exatamente o que estavam fazendo ali. Surpresa maior no momento da comunhão quando um daqueles anjos – uma menina linda de longos cabelos cacheados – começou a cantar acompanhando muito bem a letra e a melodia. Momento de pura ternura. Coração cresceu no peito e agradeceu a Deus pela oportunidade de senti-Lo naquelas pequenas obras de Suas mãos.
 Saí daquele local com uma sensação de pura paz e, no íntimo, um coração enorme, cheio de amor. Nos olhinhos atentos daquelas crianças e na pureza dos olhares fixos nas coisas sagradas, a esperança de um mundo melhor, mais fraterno, mais humano. A perspectiva de um amanhã sem tanto ódio e violência. A confiança de que teremos cada vez mais crianças criadas com amor, educadas na fé – premissas de uma juventude sadia, amada e com muito amor no coração. A fé nas palavras de Jesus: “Eis que estarei convosco todos os dias”. No reflexo daqueles pequeninos, a idealização de um sonho de paz e justiça.
Luisa Garbazza
Quinta-feira Santa - 28 de março de 2013.

sábado, 16 de março de 2013

A felicidade nossa de cada dia


Curioso e intrigante é ver como convivemos com o tempo. Muitos o têm como amigo e outro tanto, quase como inimigo. Alguns são escravos, outros o tratam com indiferença. Há ainda os que querem o tempo sempre a seu favor. Assim, no dia a dia em que vai se dissipando nossa existência, transparece, pelo menos em algum momento da vida, certa insatisfação a respeito do tempo.
Em cada fase da vida o tempo tem um valor peculiar. É a infância com seu encanto próprio, horas que passam lentamente, sem indagações, como magia. É a fase da adolescência e da juventude, quando o tempo nunca é suficiente para fazer tudo que almeja. São os adultos aproveitando cada ocasião para colocar as coisas em seus devidos lugares. E a velhice, época em que se tem a impressão de que o tempo parou. Contudo, na adolescência e juventude a sucessão das horas é mais questionada. Trava-se uma luta severa contra esse inimigo invisível que teima em contrariar as vontades, enganar as previsões, trair os decretos. Tudo nessa fase é urgente. O amanhã é agora. Depois, é tarde demais.
Um detalhe que me chama à atenção é o modo como os jovens lidam com o tempo. Principalmente com os dias da semana. Ninguém gosta da segunda-feira. Os dias da semana se arrastam numa lentidão enorme deixando todos ansiosos. A sexta-feira é comemorada com palmas, fogos e folguedos. O final de semana passa rápido demais, domingo à tarde já é o fim do mundo. E a segunda retorna - mal amada, triste, pesadona. Parece até que tem culpa de algum infortúnio que possa acontecer, ou não acontecer, na vida de alguém. E quando o final de semana passa e não acontece nada de extraordinário? Ou acontece algo negativo desmoronando algum sonho? Aí, a espera pelo próximo fica ainda mais penosa. A segunda será mais desprezada e cada hora é contada com aflição à espera de uma nova oportunidade.
Nesse sentido, faz-se necessário uma reflexão sobre tempo e vida. A vida é o nosso dom mais precioso e o tempo deve ser nosso aliado na arte de bem vivê-la. Saber viver bem é valorizar cada dia como único. Valorizar cada hora do dia sem querer que ele se esvazie rapidamente para um novo amanhecer. Agir conscientemente, apreciando cada tarefa, tenha a dimensão que tiver. Desde um sorriso dado, até o ofício mais complexo, cada ato faz parte do momento de agora e deve ser realizado com alegria e esmero.
Outro ponto que merece destaque é a rotina. Essa nossa companheira deve ser amada também, por que não? Nossos dias passam rápido, cada um com uma movimentação diferente. Não temos novidades, festas, encontros, baladas, trabalhos, companhias todos os dias. Nem temos resistência para tanto. Necessitamos de períodos de descanso para relaxar o corpo e a mente, para pensarmos sobre nossos atos, para programar o futuro.
A rotina é indispensável para nossa existência e precisamos aprender a gostar dela. E principalmente gostar do que fazemos. Se hoje é segunda ou terça-feira e estamos sobrecarregados de tarefas, façamos uma a uma, com a cabeça erguida e a certeza de que aquele momento é único em nossa vida. Seja o trabalho mais ínfimo, mas que seja realizado com amor para nos proporcionar o prazer do dever cumprido e nos deixar com a consciência tranquila. Percebemos isso até na Igreja, quando organiza o calendário litúrgico. Vivenciamos as grandes festas, como Natal, Quaresma, Páscoa e Corpus Christie, mas a rotina aparece nos Domingos do Tempo Comum.
Na passagem exclusiva da vida, quem não gosta da rotina é porque ainda não aprendeu a gostar de si mesmo. A rotina incomoda os que têm dificuldade de conviver consigo mesmo e precisa ter sempre alguém ou algo novo para preencher o vazio deixado pela falta de amor próprio. Enquanto buscarmos nossa realização pessoal em outras pessoas e em outras coisas, de preferência novas a cada dia, a rotina vai ser um fardo por demais pesado e dará trabalho para carregar. Nisso, também, a Igreja nos ajuda. Temos, no domingo, a oportunidade de participarmos da Santa Missa, momento oportuno para recebermos as graças necessárias para bem vivermos a semana vindoura. Assim sendo, quando percebermos que a alegria vem da graça de Deus e está dentro de nós, enfrentaremos com mais tranquilidade as vicissitudes da vida, cada dia terá seu encanto e seremos muito mais felizes.  
Luisa Garbazza
Fevereiro de  2013.

Versão publicada no Jornal Paróquia
Paróquia Nossa Senhora do Bom Despacho em março de 2013.

quarta-feira, 13 de março de 2013

"Habemus Papam!"


Não poderia haver manifestação melhor para consagrar o Ano da Fé do que o mar de fiéis presente na Praça de São Pedro, em Roma, no momento do conclave que escolheu o novo sucessor de Pedro. O mundo inteiro estava ali! – Fato percebido pela diversidade de rostos focalizados pelas câmeras e pela pluralidade de bandeiras sendo agitadas para concretizar a ansiedade contida. A espiritualidade foi marcada pelas inúmeras mãos que exibiam terços em sinal de oração constante.
A multidão que ali se reunia não se envergonhava de exteriorizar o sentimento de ansiedade em um momento tão singular para a Igreja Católica. Para quem, como eu, assistia a tudo pela tela da televisão, a impressão era de que não caberia mais ninguém naquela praça, tamanha a proximidade das pessoas. Todos os olhares se dirigiam constantemente para a chaminé que anunciaria o resultado do conclave.
Depois que a fumaça pintou de branco o céu de Roma, já enegrecido pelas sombras da noite, a emoção foi incontrolável. Todo sentimento contido foi agora externado em forma de imensa euforia manifestada pelos gritos, pelos sorrisos de muitos e pelo silêncio de alguns. A partir desse momento, a expectativa foi tão grande que fez parecer infinito o tempo de espera para conhecer o escolhido, vê-lo aparecer na janela, conhecer o nome por ele escolhido e ouvir suas primeiras palavras. E o grito era um só: “Viva o Papa!”
Durante a espera, era visível a alegria daquele povo, que, como os cristãos do mundo inteiro, aguardava a primeira aparição do novo Vigário de Cristo.  Todos os olhares estavam direcionados para aquela janela histórica tanto dos que estavam presentes como dos que acompanhavam a focalização das câmeras. O coração, cheio de alegria, se mostrava inquieto e mais e mais ansioso.
O instante em que as luzes foram acesas foi brindado com gritos em uníssono e mais uma vez, a plenos pulmões: “Viva o Papa!” Mais um pouco, presenciamos a janela sendo aberta lentamente, a aproximação do cardeal francês Jean Louis Tauran e os dizeres tão esperados: “Habemus Papam!” O Papa escolhido foi o cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio – que passa a ser – Papa Francisco.
Em seguida, com a aproximação do eleito, a emoção tomou conta. Por alguns segundos foi impossível pronunciar qualquer palavra, pois a multidão emocionada soltou a voz em saudação ao Santo Padre: gritavam, cantavam, acenavam, agitavam as bandeiras, sorriam... Alguns permitiram que toda a agonia da espera fosse dissolvida pelas lágrimas que lhe lavaram a alma. Depois foi o momento de vê-lo corresponder ao sorriso de milhares de pessoas que o aguardaram por tanto tempo; ouvir suas simples, porém significativas palavras e a elas se curvar em sinal de humildade.
Logo após, o Papa Francisco se retirou. A calmaria foi tomando conta da multidão que, aos poucos, foi se afastando. Agora, o momento é de agradecer a Deus pelo novo chefe da Igreja. Pedir que ele seja abençoado e inspirado pelo Espírito Santo para conduzir com sabedoria essa grande barca rumo às águas mais profundas. Assim poderemos sonhar com um mundo em que haja cada vez mais amor, fraternidade, união e muita paz. Essa paz tão sonhada por São Francisco de Assis, o qual, com certeza, estará nos abençoando mais ainda.
Luisa Garbazza
13 de março de 2013

sábado, 2 de março de 2013

A caminho da paz


Bom despacho, como várias cidades de seu porte, cresce a cada dia. Chegou a universidade – tão sonhada por todos –, aumentou o número de habitantes, de veículos, de comércios. Presenciamos a expansão geográfica que acontece rapidamente e não conseguimos acompanhar de perto. Às vezes não sabemos mais que rua é essa ou onde fica aquele bairro.  E nem tudo acontece de forma positiva.
Pagamos um alto preço pelo progresso, que veio acompanhado da violência. O ônus mais alto e negativo desse processo de crescimento são as drogas, disseminadas por toda parte. As consequências são cruéis, dolorosas, penosas. Estamos sempre nos solidarizando com as famílias marcadas por alguma tragédia provocada por essa inimiga implacável.
Por outro lado, entre tantos atos de agressão ao direito do semelhante, convivemos com outra ameaça ao sossego de nossas famílias: o desaparecimento de pessoas. De vez em quando, ouvimos o nome de alguém que saiu de casa e ninguém mais teve notícias. Uns permanecem na incógnita, outros são encontrados mortos, brutalmente assassinados, comovendo a cidade inteira.
Inspirado pela tristeza e pela revolta ao presenciar atos de crueldade tamanha, um grupo idealizou e mobilizou a população para uma chamada de consciência a todos os bom-despachenses: A primeira caminhada pela paz.  
Sábado, dois de março de dois mil e treze. Às nove horas da manhã iniciou a aglomeração em frente à Igreja Matriz de Nossa Senhora do Bom Despacho no centro da cidade. Começou timidamente por causa da chuva fina que teimava em participar daquele grito silencioso por dias melhores. Aos poucos foram aumentando o número dos que não queriam cruzar os braços diante de atos tão indignos do ser humano. Faixas e balões brancos representavam a paz que também estava presente no branco das camisas da maioria. A emoção foi maior quando foram chegando os familiares do Flávio Luciano, jovem e querido cidadão, vítima recente da atrocidade de pessoas desumanas, indiferentes ao sofrimento do próximo.
Às dez horas, após uma oração e breve apresentação dos objetivos da caminhada, saímos pelas ruas, sem alarde, sem pressa, apenas sugerindo o valor de cada um de nós, filhos de Deus, e o direito que temos de viver com dignidade. No meio do percurso, a chuva reforçou a ideia de que devemos nos limpar de todo ódio, de todo desejo de vingança e sermos mais mansos, mais humildes e lutar pela justiça e pela serenidade.
No final da caminhada, a emoção tomou conta de todos. No momento em que rezamos juntos, de mãos dadas e fizemos um minuto de silêncio, o significado desse gesto ficou mais evidente e muitos não conseguiram segurar as lágrimas. A salva de palmas quando os balões brancos subiram aos céus levando nossas preces selou o desejo de cada coração ali presente: Que a paz e a justiça se estendam sobre nossa amada Bom Despacho.  
Tomara que esse gesto possa dar muitos frutos. Tomara possamos presenciar, aos poucos, uma tomada de consciência de toda a cidade – poderes públicos, profissionais da educação, pais, mães, filhos – em especial os jovens – policiais, religiosos, formando uma só corrente do bem. E quando pararmos para repetir esse momento, que haja a participação da maioria e o motivo não seja tão calamitoso.
Luisa Garbazza
Dois de março de 2013.
Essa crônica é dedicada ao meu ex-aluno Flávio Assis Luciano e  à sua família.