A
vida é mesmo imprevisível. De um instante a outro tudo se transforma. Algumas
vezes nem conseguimos assimilar o que realmente provocou aquele imprevisto que
tanto alterou nosso dia a dia. Ainda mais quando nos deparamos com obstáculos
que independem de nosso esforço, de nosso conhecimento ou de nossas
experiências.
Um desses percalços veio emaranhar
minha rotina dificultando a execução de tarefas. Em uma viagem noturna a uma
cidade vizinha, andando devagar, na companhia de meu filho e de outras pessoas
conhecidas, em uma rua com calçamento irregular, vi-me repentinamente estirada
no chão. Não sei explicar o que aconteceu nem o que causou aquela queda.
Simplesmente caí. No instante seguinte, meu filho ajudou-me a levantar e várias
pessoas se aproximaram para ver se estava tudo bem. Fiquei alguns minutos sem
respirar tamanha a dor que eu sentia, mas me recompus logo após. “Está tudo
bem.” Consegui andar com tranquilidade, apenas com um leve arranhão na perna. Contudo,
no instante seguinte, senti uma dor aguda em minha mão direita. Levantei o
braço e percebi que um pequeno inchaço já se formava na altura do pulso. Fiquei
com o braço erguido e continuei o caminho.
Por
algum tempo consegui disfarçar o sofrimento, mas meu braço estava muito
machucado e inchou bastante. Por isso, tivemos que retornar antes do previsto
para procurar ajuda médica. Chegamos ao Pronto Atendimento por volta das onze
horas da noite. Havia várias pessoas na portaria, porém não demorou muito para
eu ser atendida. A médica deu uma olhadinha básica e disse que não podia fazer
nada no momento. Receitou um anti-inflamatório, pediu à enfermeira que
enfaixasse meu braço e disse-me para voltar no dia seguinte.
No
outro dia, uma manhã de sábado, meu filho levou-me novamente ao hospital.
Depois de uma espera angustiante, fui chamada para fazer uma radiografia. Outra
espera até que o médico pudesse avaliar o resultado. Dois médicos – clínicos – olharam
o exame e disseram que havia fratura. Deram-me um encaminhamento para eu voltar
domingo – quando haveria um ortopedista de plantão para tomar as devidas
providências.
Domingo
de manhã, começou tudo outra vez: chegar ao hospital – fazer uma ficha para
atendimento – aguardar o médico chegar – aguardar minha vez de ser atendida –
levar a radiografia para o médico avaliar – ouvir o diagnóstico: “Não está
quebrado. Aqui parece que tem uma fratura, mas não tem. Pode ficar tranquila.
Vai demorar um pouco para ficar bom, pois machucou bastante. Continue com o
medicamento e põe gelo.”
Havia apenas uma atitude a tomar: ir
embora para casa. Apesar da dor e da impossibilidade de movimentar a junta da
mão, convenci-me de que não havia nada a fazer. Fui avaliada por uma
especialista. – Somos leigos nessa área do conhecimento. Precisamos confiar nos
profissionais.
Assim, passaram-se dias, semanas e
nada de melhoras. As pessoas sempre me indagando sobre a permanência da faixa
em meu braço. Comecei a ficar preocupada. A dor persistia, o inchaço pouco
diminuiu e os movimentos continuavam restritos. Resolvi então procurar outro
médico. Fui ao meu clínico de confiança e pedi orientação. Ele sugeriu-me outra
radiografia. Quando a consegui, o próprio radiologista viu que meu braço não
estava normal. “Se eu fosse você eu nem esperava o laudo do exame. Procuraria
direto um ortopedista. Pela experiência que tenho eu digo a você que seu braço
está quebrado.”
Ainda demorou alguns dias para eu
conseguir uma consulta com outro ortopedista – agendas cheias, licenças,
serviço público em protesto. Quando fui atendida, havia já um mês que eu estava
com a mão machucada. Ali, durante a consulta, comprovou-se a fala do
radiologista: “Está quebrado.” Todas as radiografias, inclusive a primeira,
mostravam a fratura.
“Infelizmente,
talvez o médico fosse inexperiente e não constatou a fratura. Ainda bem que o
osso não saiu do lugar. Vamos imobilizar seu braço agora mesmo.”
Saí da clínica um tanto
decepcionada. Desiludida por pensar no tempo que ainda ficarei com a mão
imobilizada; por refletir no transtorno que um diagnóstico errado pode causar
na vida de uma pessoa – e não é a primeira vez comigo; por perceber a falta de
preparo de alguns profissionais, que deveriam questionar suas dúvidas antes de
prejudicar alguém dando tamanha certeza de sua análise; por constatar o descaso
com a saúde pública em minha cidade, que não tem aparato suficiente nem para certificar
uma fratura e tomar as devidas providências.
Por
tudo isso, fico meditando sobre o quanto é importante aprendermos a fazer as
coisas bem feitas, aprimorando cada vez mais nossos conhecimentos
profissionais, principalmente se a vida dos nossos semelhantes estiver envolvida.
E compreendo com mais profundidade a fragilidade do ser humano, que depende do
outro sempre, e, às vezes, age como se o outro nem existisse, ou vivesse apenas
para servir aos seus propósitos.
Luisa Garbazza, 31 de julho de 2012