terça-feira, 27 de março de 2012

Cultivando a alegria

      É curioso perceber o poder que as palavras exercem em nós. Podemos ler uma frase de impacto ou um texto e, simplesmente, passar por ele. Esse mesmo texto, lido em um momento de fragilidade emocional, pode interferir efetivamente em nossa maneira de pensar e agir.
      Aconteceu-me, no último final de semana, um exemplo dessa constatação. Amanheci tristonha, angustiada com certas ideias e bem quieta, taciturna. Esposo e filho arrumavam para sair – iam a Divinópolis – e chamaram-me para ir junto. Sem cogitar qualquer atitude contrária, disse que não iria, nem compensava, o tempo era curto, nem valeria a pena. Comecei a ler o caderno “Cultura” do jornal Estado de Minas e interrompi meditando algumas palavras da psicanalista Regina Teixeira da Costa em seu texto “A promoção da alegria”:
      “Uma coisa é certa: viver é uma peleja constante. Quando a gente pensa que chegou a hora do sossego... lá vem mais. Sem esquecer que é mais fácil ser infeliz do que feliz. Para viver penando basta não fazer nada. É só deixar a vida rolar de qualquer jeito, passivamente, sem interferência nem intervenção.”
      É bem verdade. Ser infeliz é muito mais fácil. Deixar a vida passar e ficar na posição de vítima, reclamando da sorte, não dá trabalho nenhum. Em vários momentos da vida, desempenhamos esse papel. Por qualquer contrariedade nos sentimos vazios, como se tudo tivesse perdido o sentido. Nesses instantes, acreditamos cegamente que somos infelizes.
      Podemos nos sentir fragilizados e nos entregar ao pessimismo passando aos outros a impressão de sermos pessoas miseráveis, abandonadas à própria sorte, sem amor, sem carinho nem proteção. Porém, às vezes, nem nós mesmos sabemos o motivo de tão negativo sentimento. É um vazio existencial que nos domina e nos faz sentir a pior pessoa da terra. Mergulhamos nesse universo por um simples descontentamento, algo que não deu certo, alguém que não correspondeu a nossa amizade ou amor, um grupo que não nos aceitou... qualquer desconcerto na vida é suficiente para nos lançar ao abismo e crer na ausência de solução.
      Contudo, ao ler aquelas palavras no jornal, comecei a pensar na inutilidade desses sentimentos. É muito fácil ficar triste e se entregar à solidão. Mas é mais saudável lutar para se libertar de pensamentos negativos. É mais tranquilo entrar no quarto, colocar uma música que traduza o sentimento e mergulhar na melancolia. Mas é mais benéfico ir ao encontro do outro e dividir os problemas, interagir, buscar novos caminhos. É bem simples colocar a culpa nas outras pessoas ou nas circunstâncias e se fazer de “coitado”. Mas é mais libertador ter fé em Deus e lutar por dias melhores, por momentos de paz interior, pela aceitação das dificuldades. Sempre teremos problemas na vida, todavia não precisamos nos entristecer e sim buscar a melhor maneira de resolver os reveses e aprender com cada situação.
      Acreditei tanto nessas palavras que quando meu filho perguntou se eu não queria ir mesmo, “Fazer companhia!”, pedi cinco minutos, arrumei-me rapidamente e segui com eles. A tristeza foi ficando para trás. A certeza agora era de que tudo seria diferente. Outra seria minha maneira de analisar esses sentimentos traiçoeiros que nos roubam a paz e a alegria de viver. Cultivar tristeza é anular o próprio direito de ser feliz.
      O final da viagem foi um pouco desastroso – o carro quebrou próximo a Nova Serrana; tivemos que deixá-lo em um posto e terminar o percurso de ônibus – porém, meu moral não foi abalado. Incrível como consegui manter a calma e, apesar do problema, encontrar motivos para me alegrar percebendo que estávamos todos bem, além de ter sido tão bom passar esse tempo com minha família.
Luisa Garbazza – 27 de março de 2012

domingo, 11 de março de 2012

Vem, Senhor Jesus!

          A Celebração Eucarística, uma música de ação de graças, um grito jovem em uníssono, um canto de louvor, abraços e mais abraços – na turma, nos pais e nos amigos, algumas lágrimas, muitos sorrisos e corações transbordando de alegria e amor. Assim, em meio a esse torvelinho de emoções, encerrou-se mais um Maranathá.
          Como um oásis em meio ao burburinho do Carnaval, um grupo de jovens pararam por três dias para um “carnaval” diferente. Reservaram um tempo para se aproximarem mais de Deus. Aceitaram a proposta de renovação, de meditação, de encontro consigo mesmo e com o Criador.
Durante uma visita ao local do retiro (convidada por alguns jovens), participei de um maravilhoso momento de louvor e adoração, que me deixou emocionada. A presença de Jesus era incontestável. A música, de uma letra tão intensa, calava fundo na alma. Que bonito ver aqueles jovens aos pés de Jesus, abrindo o coração para Ele. Uns comovidos, andando de um lado para outro. Alguns em um silêncio tão profundo! Outros, como se estivessem sendo purificados, derramavam-se em lágrimas. Ninguém ficou insensível, nem mesmo eu. Quando dei por mim, senti lágrimas caírem tranquilas por minhas faces, revelando um momento de pura comunhão com Deus.
          Em seguida, nos poucos minutos que ali estive, senti uma convivência harmoniosa entre todos: os adolescentes e jovens que vivenciavam o encontro; os jovens que coordenavam as atividades; os adultos que ajudavam na cozinha e apoiavam tão bela obra. Um clima de paz e amizade reinava em todos os ambientes por onde andei. Todos juntos, engajados em um só ideal, firmes no mesmo propósito: expandir o reino de Deus aqui na terra.
          É admirável, nessa sociedade globalizada em que vivemos, constatar que existem tantos jovens com disponibilidade e aceitação para participar de um movimento com o objetivo de conhecer Jesus melhor e colocá-lo como prioridade em todos os momentos da vida. Jovens que descartam a avalanche de alternativas que lhes são oferecidas, quase sempre para uma existência sem compromisso, com o prazer acima de tudo e optam por seguir Jesus aceitando seus ensinamentos.
          Missão cumprida. Depois da despedida, vem o mais importante: o dia a dia de cada jovem. A vida continua. Tudo aqui fora está do mesmo jeito. Eles precisam de muita fé e coragem para colocar em prática o que vivenciaram e aprenderam. Precisam da ação do Espírito Santo para manter acesa a chama do amor fraterno e disseminar esse sentimento entre as outras pessoas.
          Vem, Senhor Jesus! Vem reinar entre esses jovens de coração puro. Vem reinar entre os jovens que decidiram seguir seus ensinamentos só por hoje... e por hoje... e por hoje... Mas, acima de tudo, vem reinar entre todos os jovens, inclusive aqueles que estão tão distantes de Ti, carentes de seu amor. Assim, pouco a pouco, veremos o reino de Deus acontecendo na face da Terra e poderemos dizer a uma só voz: “A Ele a Glória, a Ele o Louvor, / A Ele o Domínio, Ele é o Senhor”. 
Luisa Garbazza – 02 de março de 2012

Crônica publicada originalmente no Informativo IGREJA VIVA, da Paróquia Nossa Senhora do Rosário no mês de março.

sexta-feira, 2 de março de 2012

A efemeridade da vida

      Certos momentos na vida, que no princípio parece rotineiro, tomam uma proporção inimaginável e confundem nossas convicções mais consagradas. Foi o que aconteceu comigo em uma visita ao Asilo. Serviria apenas ao cumprimento de um propósito feito por um grupo de oração. Porém, o que aconteceu foi de uma dimensão inesperada. E deixou marcas que dificilmente serão esquecidas.
      Manhã de sábado. Chegamos ao local sem saber o que fazer ou a quem procurar, pois não havíamos combinado nada nem marcado horário. Vários idosos estavam no pátio da frente “tomando” sol. Aos poucos, fomos nos inteirando dos acontecimentos. Entregamos à coordenadora algumas coisas que levamos para os internos. Cumprimentamos uns, conversamos com outros, sem muita intimidade. Seria apenas uma visita rápida. Mas Deus nos reservou algo mais profundo.
      Poucos minutos após nossa chegada, apareceu também um conhecido nosso para prestar serviço voluntário. Conversando, ele nos contou que ia sempre, aos sábados, para ajudar nos cuidados para com os “velhinhos”, principalmente com a higiene pessoal. E convidou-nos para ajudá-lo. Aceitamos o desafio e o ocorrido deixou-me emocionada.
      Começamos a cortar as unhas dos velhinhos e lixá-las para “não agarrar nos cobertores” como nos disse um deles. Eram mãos e pés cansados, quase sem movimento e frágeis. Tinham que ser manuseados com cuidado. Um jovem, também prestando trabalho voluntário, fazia a barba dos homens e fomos orientadas a aparar os pelos das sobrancelhas e orelhas, que incomodam muito. Eles agradeciam, contavam algo sobre suas vidas, sorriam em reconhecimento. Outro voluntário chegou com um violão e pôs-se a cantar alegrando o ambiente. Alguns até arriscavam a cantar junto.
      Em dado momento, parei um pouco e comecei a observar aquelas pessoas. Não pude controlar a emoção. As lágrimas vieram fáceis aos meus olhos. Alguns estavam tranquilos, serenos, conversando. Outros repetiam a mesma frase sem parar: “Fazer a barba.” Uma mulher andava de um lado para outro com um cigarro na mão. Um fazia questão de deixar bem claro que não gostava dali, achava muito barulhento e ele gostava de silêncio. Havia os que permaneciam alheios aos acontecimentos, não tinham mais consciência do que estava acontecendo. Num canto mais isolado, em uma cadeira de rodas, uma mulher chorava a ausência do filho que há muito não a visitava. Estava inconsolável. Coração doeu no peito. Afinal, os pais merecem respeito em qualquer fase da vida. Honrar pai e mãe não é só na catequese, é para a vida toda.
      Percebi que havia muita tristeza camuflada naquele lugar. Meu Deus, como o ser humano pode acabar assim? Depois de tantas lutas, anos de peleja, filhos criados às vezes com muita dificuldade, acabar assim, sozinho, isolado, abandonado. Por melhores que sejam as condições do lugar, por mais paciência que os cuidadores tenham, não vale por uma família, mesmo a mais simples. Por mais bem tratados que estejam, as lembranças de uma época em que eram capazes de dirigir a própria vida é inegável. Pude constatar isso em muitas lágrimas que percebi escorrendo silenciosas em faces marcadas pela melancolia.
      Os sentimentos que me invadiram foram de tristeza e impotência diante dessa adversidade. Isso tudo me fez sentir a urgência de sabermos valorizar mais as pessoas com as quais nós convivemos. Reconhecer a efemeridade da vida é motivo mais que suficiente para pensarmos melhor em nossas atitudes e decisões. Não sabemos o que vai nos acontecer no futuro, quais as dificuldades que o mundo se encarregará de trazer até nós. Por isso, cada pessoa merece nosso respeito e nossa consideração, seja ela criança, jovem ou idosa. Assim estaremos plantando sementes de amor e misericórdia para colhermos quando for a nossa vez de necessitar de alguém que nos conduza. 
                                                             Luisa Garbazza    29/02/2012